Fábio Vieira/Metrópoles São Paulo — Quando o operador de esteira Arisson Moreira Júnior, de 34 anos, cumpriu com sua obrigação profission...
São Paulo — Quando o operador de esteira Arisson Moreira Júnior, de 34 anos, cumpriu com sua obrigação profissional e barrou duas bagagens suspeitas, no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, na região metropolitana, ele assinou sua sentença de morte.
Dentro das malas, entregues pelo aeroportuário à Polícia Federal (PF), em 9 de janeiro de 2020, havia 60 quilos de cocaína, que seriam remetidos para a Europa. Lá, poderiam render até R$ 30 milhões ao Primeiro Comando da Capital (PCC), responsável pelo esquema de tráfico de drogas.
A facção chega a pagar o equivalente a um ano de salário por bagagem para funcionários que contribuem com os despachos ilegais, como mostrou o Metrópoles.
O operador trabalhava na esteira de embarque do Terminal 2, de voos nacionais (domésticos), quando avistou duas malas com destino a Porto Alegre (RS), mas com etiquetas de um voo internacional, segundo denúncia do Ministério Público de São Paulo (MPSP).
Quando ele retirou as bagagens da esteira, Márcio Roberto Pires, de 56 anos, aproximou-se, afirmando que levaria as duas malas para a conexão internacional. Arisson não permitiu, apontando o fato de Márcio não estar na escala de trabalho naquele dia.
De acordo com relatório do MPSP, Márcio é “membro de associação criminosa” e, na divisão de tarefas, “ficou incumbido de retirar da esteira a bagagem contendo a droga”.
Para tentar convencer a vítima a lhe entregar as bagagens, Márcio mostrou fotografias, em um celular, das malas separadas por Arisson. As fotos, segundo investigações da PF, são enviadas por comparsas que despacham ilegalmente as bagagens no balcão de check-in, para que elas sejam identificadas na área restrita do aeroporto.
Arrison continuou se negando a entregar o par de malas. Câmeras de monitoramento registraram Márcio tentando arrancar as bagagens à força das mãos da vítima, sem sucesso. A PF foi acionada em seguida por Arisson e, dentro das malas, foi encontrada a carga milionária de cocaína.
Ameaça e morte
Dois dias após a apreensão da droga, de acordo com o MPSP, Márcio teria abordado Arisson em um ponto de ônibus e lhe afirmado: “Você, eu já passei para os caras”, referindo-se ao fato de ter relatado ao PCC sobre a apreensão das malas, por causa ação da vítima.
Por volta das 18h50 do dia 13 de janeiro, Arisson voltava para casa, em seu carro, quando foi interceptado no bairro São João, em Guarulhos, por um Ford Ranger, ocupado por três criminosos. O aeroportuário foi fuzilado e morreu ainda no local.
Os assassinos abandonaram o carro, com placas adulteradas, alguns quarteirões adiante. Foi constatado que o veículo, do Rio de Janeiro, fora roubado.
Única prisão
O Setor de Homicídios e de Proteção à Pessoa (SHPP) de Guarulhos investigou o caso e, em 15 dias, prendeu Márcio.
“Pelo modo que a execução ocorreu, podemos observar que foi feito por membros de uma organização criminosa, envolvida com o tráfico de drogas, e por causa de dinheiro”, explicou ao Metrópoles, nessa quinta-feira (20/4), o delegado Wagner Terribili, titular do SHPP.
Márcio foi condenado, em setembro do ano passado, a 33 anos, 2 meses e 12 dias de prisão, em regime fechado, segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo. A defesa dele não foi localizada até a publicação desta reportagem.
Os três criminosos que executaram Arisson não foram identificados.
Esquema criminoso
Em 2020, a PF organizou e unificou vários inquéritos policiais abertos para investigar os integrantes do esquema criminoso que usa o Aeroporto de Guarulhos a fim de despachar drogas para a Europa.
Os funcionários da área restrita, encarregados de pegar as bagagens, depois que elas são despachadas pelos passageiros no check-in, e colocá-las dentro do avião, são a base da pirâmide e recebem de R$ 25 mil a R$ 30 mil por cada mala despachada com a droga, normalmente cocaína.
O esquema ganhou repercussão quando veio à tona o caso de duas mulheres de Goiânia (GO) que tiveram as bagagens trocadas por malas com cocaína e foram presas por tráfico internacional de drogas em Frankfurt, na Alemanha, em 5 de março.
As malas de Jeanne Cristina Paolini Pinho e Kátyna Baía foram despachadas no Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia, mas as etiquetas das bagagens foram tiradas e postas em outras malas no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. Cada uma tinha cerca de 20 quilos de cocaína.
Depois que a PF mostrou que elas foram vítimas do esquema criminoso comandado pelo PCC dentro do Aeroporto Internacional de São Paulo, as brasileiras foram soltas da prisão na Alemanha, no último dia 11, e retornaram ao Brasil.
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