A Justiça Federal de Ilhéus (BA) determinou, no início deste mês, a reintegração de posse de uma área denominada Loteamento Canto das Água...
A Justiça Federal de Ilhéus (BA) determinou, no início deste mês, a reintegração de posse de uma área denominada Loteamento Canto das Águas. São 30 lotes sobrepostos à aldeia Cajueiro, Terra Indígena Tupinambá de Olivença, e explorados pela Ilhéus Empreendimentos S/A para o mercado imobiliário de luxo e turístico. A decisão é assinada pela juíza substituta Letícia Daniele Bossonario.
De acordo com os
Tupinambá, 52,8% do loteamento está inserido em terras tradicionalmente
ocupadas. A informação tem como base os estudos técnicos necessários à
demarcação, que estão finalizados e aprovados pela Fundação Nacional do Índio
(Funai) - aguardam apenas a publicação da portaria declaratória.
"Nossa ocupação
vem desde 2013. A especulação imobiliária vem da área Norte fazendo loteamento
na área de mangue. Nosso povo ocupa a parte do litoral, o lado Sul, a da praia,
onde os mangues estão preservados. Não é verdade que chegamos aqui em agosto
deste ano", explica o cacique Val Tupinambá.
O mangue é utilizado
por todas as aldeias da Terra Indígena, da mata ao litoral, enfatiza o cacique
Val. No caso específico da reintegração, o impacto é direto ainda sobre 70
famílias Tupinambá da aldeia Cajueiro. Outras 196 famílias da aldeia Acuípe de Baixo
e 16 da aldeia Lagoa do Babaço também serão impactadas em caso de reintegração.
A liderança indígena
explica que a área sobreposta à Terra Indígena está preservada, utilizada de
forma sustentável por marisqueiras e pescadoras, impactando assim a subsistência
e a territorialidade do povo, além de rituais específicos, como o da lua cheia.
"É uma área de sustento, de manutenção da vida", diz.
A decisão pelo
despejo contraria o Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu quaisquer
ações de reintegração de posse enquanto durar a pandemia. A decisão do ministro
Edson Fachin foi proferida no dia 6 de maio como apêndice do processo de
Recurso Extraordinário 1.017.365/SC.
São 282 famílias
impactadas de forma direta por uma possível reintegração e aldeias de toda
Terra Indígena que serão privadas do mangue, que representa subsistência e
espiritualidade. "Mais uma vez a gente vê um descumprimento do Judiciário
da Bahia. Essa determinação é de suspensão nacional dos processos judiciais que
tramitam no judiciário, principalmente ações possessórias, que possam ocasionar
reintegrações de posse e retiradas de indígenas de suas terras nesse período de
pandemia", afirma a assessora jurídica e representante judicial da
comunidade Samara Pataxó.
Esta já é a quinta
reintegração de posse deferida pela Justiça Federal da Bahia após a
determinação da Suprema Corte. Além desta contra os Tupinambá, houve três
contra os Pataxó (uma na aldeia Novos Guerreiros, TI Ponta Grande, e duas na TI
Comexatiba) e uma outra contra os Tuxá de Rodelas. "A situação do
Tupinambá, portanto, não é um caso isolado. Esse ano tivemos outras situações
parecidas de reintegrações de posse sendo determinadas contra comunidades
indígenas mesmo diante da decisão do ministro Fachin que está em sua plena
eficácia e aplicabilidade", diz Samara.
Ela explica que o
grupo interessado nas terras tradicionais Tupinambá são, basicamente, de
empresários ligados ao ramo imobiliário que vê nelas amplo potencial turístico,
pois estão próximas de uma rodovia federal, praias e Mata Atlântica, e também
para moradias de alto padrão com a construção de condomínios de luxo. "Há
fazendeiros e empresas de mineração, como se verifica em outras aldeias da
Terra Indígena. Mas cito a Vila Galé (de um grupo português), que queria
construir um hotel no território", lembra Samara. O caso envolveu o
presidente da Embratur que pediu o encerramento da demarcação da Terra Indígena
Tupinambá para facilitar o estabelecimento do empreendimento.
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